Estarão todas as obras plásticas protegidas por direitos de autor?

2022-11-30T15:33:00
Portugal
Tribunal indefere um recurso alegando que algumas instalações carecem de originalidade para serem protegidas pelas regras de direitos de autor
Estarão todas as obras plásticas protegidas por direitos de autor?
30 de novembro de 2022

A Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa decidiu recentemente, por unanimidade, um recurso sobre um litígio relativo à construção de um parque aquático.

Neste caso, a empresa autora intentou uma ação inibitória, solicitando a proibição imediata da empresa requerida, através de terceiros contratados, de continuar a executar o projecto de arquitectura e especialidade descrito no contrato de elaboração de estudos e de projectos e de reabilitação, restauro, instalação e expansão do parque aquático em causa (o "Contrato"). A recorrente, uma empresa que se dedicava à produção, concepção, instalação, comercialização e exportação de equipamento infantil, de lazer e desportivo, alegou assim que a recorrida não podia continuar o trabalho no parque aquático com uma terceira empresa no terreno, porquanto o projecto por ela elaborado estaria protegido por direitos de autor, não tendo sido pagos os respetivos valores devidos.

No final, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu julgar improcedentes os pedidos do recorrente e considerou o recurso inadmissível, mantendo a decisão recorrida. Destacam-se, neste caso, a discussão subjacente, bem como as considerações que o Tribunal finalmente tece sobre os direitos de autor.

Assim, no recurso, os recorrentes procuraram defender a protecção dos seus alegados direitos de autor sobre "projectos arquitectónicos e sobre equipamento aquático". Na sua opinião, tanto os projectos de arquitectura como o equipamento aquático deveriam ser incluídos nas alíneas g) e l) do artigo 2.º do CDADC, como obras plásticas respeitantes à arquitectura.

Por conseguinte, argumentam que (i) todas as obras produzidas pelo recorrente são protegidas por direitos de autor e (ii) que o conteúdo proprietário destes direitos nunca foi transferido para o recorrido, uma vez que - argumenta-se - só seriam efectivamente transferidos quando o pagamento integral dos serviços abrangidos pelo contrato tivesse sido efectuado.

A este respeito, tanto o tribunal de primeira instância como o tribunal de recurso entenderam que:

  • Em primeiro lugar, com base nas provas fornecidas pelo recorrente, não se pode considerar que a originalidade exigida para que o equipamento aquático da obra seja protegido pelas regras de protecção dos direitos de autor (CDADC) tenha sido provada. Por conseguinte, não são considerados como estando protegidos por direitos de autor.
  • Por outro lado, em relação à transferência do conteúdo económico dos direitos de autor, o tribunal de primeira instância entendeu que a transferência da propriedade dos direitos de autor da obra arquitectónica dependia unicamente do seu pagamento, devidamente identificado no plano de pagamento acordado, não ficando dependente do pagamento integral dos valores acordados ao abrigo do Contrato e que incluiam outros serviços, como por exemplo, a reabilitação, reparação e ampliação do parque aquático, a conceção, reparação e instalação de novos equipamentos aquáticos e a coordenação dos diferentes trabalhos necessários a tal. Apesar das alegações dos recorrentes, o tribunal de recurso vai mais longe neste raciocínio, entendendo que o calendário de pagamento, de acordo com as cláusulas do contrato, permitiu estabelecer uma correlação entre cada pagamento e diferentes construções e projectos no âmbito do contrato, de modo que a transferência dos direitos de autor derivados do contrato ocorre correlativamente ao pagamento de cada um dos conceitos acima mencionados. Se tivermos também em conta que as instalações aquáticas não são consideradas, per se, como protegidas por direitos de autor, concluímos que, se os pagamentos específicos relacionados com os projectos arquitectónicos (que são indiscutivelmente protegidos por direitos de autor) tiverem sido efectuados, estes direitos foram transferidos.

É por todas estas razões que o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, finalmente, negar provimento ao recurso.

Em suma:  Esta decisão é particularmente interessante por duas razões: (i) especifica que nem todas as obras plásticas são protegidas por direitos de autor, mas que é necessária originalidade; e (ii) clarifica que os direitos económicos derivados dos direitos de autor podem ser transferidos individualmente, sem ter necessariamente em conta a globalidade dos serviços e valores contratados ao abrigo do contrato através do qual opera essa transmissão.

30 de novembro de 2022