2025-10-29T16:01:00
Portugal
O DL n.º 115/2025, de 27 de outubro vem alterar o regime jurídico do Registo Central do Beneficiário efetivo
Alterações ao Regime do RCBE
29 de outubro de 2025

Principais alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 115/2025

O Decreto-Lei n.º 115/2025, de 27 de outubro (“Decreto-Lei n.º 115/2025), vem alterar o regime jurídico do Registo Central do Beneficiário efetivo (“RCBE”), aprovado pela Lei n.º 89/2017, de 21 de agosto, transpondo para a ordem jurídica interna a exigência de “demonstração de um interesse legítimo” a qualquer pessoa ou organização que pretenda aceder às informações sobre os beneficiários efetivos.

Esta alteração está em linha com a alteração introduzida aos artigos 30.º e 31.º da Diretiva (UE) 2015/849 pelo artigo 74.º da Diretiva (UE) 2024/1640, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de maio de 2024, relativa aos mecanismos a criar pelos Estados-Membros para prevenir a utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo e surge na sequência do acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia nos processos apensos C-37/20 e C-601/20, WM e Sovim SA/Luxembourg Business Registers, que anulou a alteração introduzida pela Diretiva (UE) 2018/843 ao artigo 30.º, n.º 5, da referida Diretiva (UE) 2015/849, na medida em que exigia que os Estados-Membros garantissem que as informações sobre os beneficiários efetivos das empresas e de outras entidades jurídicas constituídas no seu território fossem acessíveis em todos os casos a qualquer membro do público em geral.

Novo regime de acesso: demonstração de interesse legítimo

Nestes termos, a nova redação do artigo 19.º, n.º 1 do regime jurídico do RCBE reflete a orientação adotada na Diretiva (UE) 2024/1640, passando a dispor que a informação “é disponibilizada, em página eletrónica, a quem demonstre ter um interesse legítimo no acesso”, ou seja, apenas as pessoas ou organizações com interesses legítimos poderão aceder às informações sobre os beneficiários efetivos das pessoas coletivas e centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica.

Ficam registados todos os acessos a informação sobre os beneficiários efetivos para fins de auditoria ao sistema pelo prazo de cinco anos, incluindo o interesse legítimo invocado.

Com esta alteração procura-se assegurar um justo equilíbrio entre a proteção de direitos fundamentais dos beneficiários efetivos – em especial o direito ao respeito pela vida privada e o direito à proteção dos dados pessoais – e a proteção do sistema financeiro da União contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, a que acresce o valor da transparência no comércio jurídico para que contribui o conhecimento dos beneficiários efetivos pelas pessoas que pretendam fazer negócios com pessoas coletivas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica na União.

Exclusão das heranças indivisas do âmbito do RCBE

O Decreto-Lei n.º 115/2025 passa a excluir as heranças indivisas do âmbito de aplicação do dever de registo do beneficiário efetivo, que, até então, excluía apenas as heranças jacentes. De facto, um dos pressupostos essenciais para a sujeição ao RCBE é o carácter voluntário da constituição da entidade e, ainda que a herança fique no estado de indivisão por vontade dos herdeiros, não são estes que dão azo a seu surgimento, não existindo qualquer obrigação legal de partilha, motivo pelo qual deve estar fora do âmbito de aplicação do dever de registo.

Na mesma lógica de delimitação e minimização, e no que respeita aos dados recolhidos na declaração, o artigo 9.º, n. º1, alínea c) do regime do RCBE, em vez de se cingir a “relativamente ao declarante” (redação anterior) passa a abranger, também, “o representante legal do beneficiário efetivo menor ou maior acompanhado”, clarificando quem pode ser identificado para efeitos de responsabilização do ato declarativo, sem equiparar o representante legal ao beneficiário efetivo.

Parecer da CNPD sobre as alterações

Antes de proceder a esta alteração, foi formulado pelo Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros um pedido à Comissão Nacional de Proteção de Dados (“CNPD”) sobre o projeto de Decreto-Lei que altera o RCBE para transpor o artigo 74.º da Diretiva (UE) 2024/1640. Na sequência deste pedido, a CNPD emitiu, a 30 de setembro de 2025, o Parecer 2025/57, do qual resulta que esta alteração procede-se “a uma equivalência para este efeito entre o declarante e representante legal do beneficiário efetivo menor ou maior acompanhado, visando cumprir o princípio da minimização dos dados”, isto é, uma equivalência funcional estritamente para efeitos de identificação e imputação do ato declarativo.

A ratio é ancorar o tratamento no cumprimento de obrigação jurídica (artigo 6.º, n.º 1, alínea c) do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”)), concretizando o princípio da minimização de dados (artigo 5.º, n.º 1, alínea c) do RGPD) e a proteção de dados desde a conceção e por defeito (artigo 25.º do RGPD), com o correspondente cumprimento dos deveres de informação (artigos 13.º e 14.º do RGPD) e da limitação da conservação (artigo 5.º, n.º 1, alínea e) do RGPD).

Nessa medida, a recolha de dados sobre o representante deve restringir-se ao indispensável para: comprovar a legitimidade da representação, assegurar meios de contacto e permitir a responsabilização pela declaração, sem o equiparar ao beneficiário efetivo, nem alargar categorias de dados.Já quanto ao plano de acesso à informação do RCBE, a CNPD saúda a substituição do acesso público pela exigência de “interesse legítimo” e a previsão de registo dos acessos, por cinco anos, incluindo o interesse invocado, como medidas proporcionais de responsabilização e auditoria.

Recorda, ainda, a reserva de lei aplicável aos tratamentos de dados e a necessidade de controlo prévio da CNPD relativamente à Portaria que definirá o modo de acesso e os dados de identificação dos utilizadores, relativamente à qual a CNPD “reserva a sua pronúncia para momento posterior”. Por fim, conclui que a proposta “não levanta novas questões do ponto de vista do direito à proteção de dados pessoais”.

Data de Entrada em vigor das Alterações ao Regime do RCBE

Embora o Decreto-Lei nada disponha sobre a sua entrada em vigor, de acordo com o regime supletivo aplicável, na falta de fixação do dia, o diploma entra em vigor no 5.º dia após a publicação, i.e., dia 1 de novembro.

 

29 de outubro de 2025